A psicanálise nasceu de uma pesquisa do corpo. Sigmund Freud estudava as lesões neuroanatômicas advindas das alterações psíquicas quando se deparou com o fato de que a anatomia dessas alterações não correspondia à anatomia biológica da qual era especialista. Verificou que há dois corpos. Um corpo biológico e um corpo sensível, psicanalítico. Heidegger chama atenção que em alemão temos duas palavras para designar o corpo: Körper (corpo material) e Leib (corpo sensível). Em seus seminários ditados em Zollikon, o filósofo afirma que “as lágrimas nunca podem ser medidas. Quando se mede, medem-se na melhor das hipóteses um líquido e suas gotas, mas não lágrimas”. Heidegger coloca a questão sobre o limite do corpo. Em termos do corpo biológico, o limite é a pele, mas do corpo sensível, o limite fica mais afastado. Este autor cria o verbo corporar: o corporar do corpo.
Assim, corpo em psicanálise vai além dos limites do corpo biológico. É fácil notar como nos embaralhamos com o nosso próprio corpo. “Levei um tombo.” “Me cortei.” “Caí doente.” As sensações corporais são sensações afetivas: “Pisei no tomate.” “Levei uma rasteira.” “Fiquei roxa de vergonha.” “Me subiu um calor!” “Você está feliz, está na cara.”
Esta distinção entre Körper e Leib é ainda mais evidente em nossos dias. A manipulação que fazemos de nossos corpos são bom exemplo: preenchimentos com silicone, tatuagens, corpo bombado. Cirurgias para rejuvenescer, para emagrecer, para mudar de sexo, para aumentar os peitos, para diminuí-los, tirar as rugas ou implantar cabelos. O tornar-se jovem pode ser mais sofrido do que envelhecer.
A pesquisa de Sigmund Freud, que preferiu estudar o corpo – Leib, foi continuada por Jacques Lacan, para quem o corpo resiste a catalogações universais. Trata-se para ele de um corpo que implica responsabilidade sexual, um corpo que não se presta ao sentido, mas que ressoa. É a responsabilidade pelo inconsciente, pelo excesso, pela singularidade. O corpo é o local do silêncio da palavra e o analista deve ser capaz de tocar esse silêncio. A orientação lacaniana destaca-se pela responsabilização que ela opera face à decisão.
Dedicaremos este Sábado no IPLA para percorrer as pesquisas de Freud, a maneira de atuação histérica de um corpo que fala e que é passível de ser interpretado, o confronto entre Körper e Leib, a problemática do corpo em Lacan e seu lugar na pós-modernidade como curto-circuito da palavra, que exige do analista uma nova forma de exercício clínico.
Em Sábados no IPLA, no dia 26 de abril, estas e outras questões serão discutidas em cinco aulas.
Corpo e Responsabilidade Sexual em Freud e em Lacan
Data: 26 de abril de 2014
Local: IPLA, Rua Augusta, 2366 – Casa 2, São Paulo
Telefones: (11) 3061-0947 e (11) 3081-6346
Valor: R$ 180,00. Alunos do IPLA e estudantes até 25 anos têm desconto de 20%.
Vagas limitadas. É necessário haver um número mínimo de inscrições para a realização do evento.
Orientação científica: Jorge Forbes
Coordenação: Elza Macedo
Programa
9h00 – 9h30: Café com bolo IPLA
9h30 – 10h30: Aula inaugural – O corpo de Freud a Lacan – Alain Mouzat
Sintoma em Freud. O corpo da histérica. Passagem do corpo biológico (Körper) para o corpo erógeno Leib). Do sintoma ao Sinthoma, em Lacan. Pulsão de morte e silêncio do real. O inconsciente considerado, não do ponto de vista da cadeia significante, mas da pulsão. Ressoar. A palavra que antes dizia, hoje, toca (Jorge Forbes).
10h30 – 11h30: Aula 2 – A responsabilidade pelo corpo só pode ser sexual – Elza Macedo
Responsabilidade pelo inconsciente. Responsabilidade pela forma de gozo. Não há relação sexual. Disparate entre reprodução e sexualidade. O sexo não tem nada de natural. Responsabilidade pelo estranho e pelo excesso. Opacidade sexual. Responsabilidade por suas contingências e por suas escolhas. Responsabilidade por sua singularidade. Você quer o que deseja?
11h30 – 12h00: Café com bolo IPLA
12h00 – 13h00: Aula 3 – O corpo na economia do gozo e a clínica do Real – Dorothee Rüdiger
A imagem que temos do nosso corpo não corresponde ao corpo biológico, pois é medida pelo gozo. (Forbes). Há um gozo destrutivo. A palavra está curto-circuitada. Pensar com os pés. Furo. Não há clínica sem ética. A clínica com portadores de doenças genéticas. O que faz acordo entre o corpo e a linguagem. Conclusão precipitada … porque é no corpo. Mais forte que eu.
13h00 – 15h00: Horário de Almoço
15h00 – 16h00: Aula 4 – Neurologia para psicanalistas – Italo Venturelli
O cérebro. Como distinguir paralisias neurológicas das histéricas? E outros diagnósticos diferenciais. O que podem as novas tecnologias no corpo neurológico? Quais limites das intervenções tecnológicas no corpo? Medicina baseada em evidências (MBE)?
16h00 – 17h00: Aula de encerramento – O corpo do analista – Liége Lise
A psicanálise só se transmite encarnada (na carne). O analista não é acomodativo, mas incomodativo. A presença do analista . Savoir-y-faire. Por de si e acessar o Real. Da palavra ao gesto. Monstração. O analista e o ator. A inscrição do ridículo. Analista cidadão. O que esperar de um analista? (Jorge Forbes).
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