Zika vírus e Genética 18/02/2016

Por Liége Lise

Entrevista com Mayana Zatz

O Brasil vive alerta de emergência de saúde pública diante da alta de casos de microcefalia relacionada ao vírus Zika transmitido pelo mosquito Aedes aegypti.  A doença foi detectada em mais de 400 bebês no país. É a primeira vez no mundo que se identifica a relação entre o Zika e a microcefalia. Diante disso, a Professora Mayana Zatz, diretora do Centro de Pesquisa do Genoma Humano e Células-tronco da USP, não ficou indiferente. Lidera um grupo de pesquisadores que vai estudar casos de gestação de gêmeos em que um dos bebês nasceu com a doença e o outro não. Os resultados dessa pesquisa serão de grande relevância científica. Em exclusividade ao Mundo Visto pela Psicanálise ela conta sobre sua iniciativa e empreendedorismo científico.

MVP – A senhora está liderando um grupo de pesquisadores que pretende investigar genes que protegem ou facilitam a microcefalia, como será este trabalho?

MZ – Quando se divulgou pela primeira vez uma possível associação entre o Zika vírus e a microcefalia, o meu questionamento  como cientista era: como age esse vírus? Qual é o mecanismo que causa a microcefalia? Será que é só ambiental ou existe uma susceptibilidade genética para bebês   expostos ao Zika vírus durante a gestação desenvolverem microcefalia? Uma maneira de responder essa pergunta seria saber o que acontece com gêmeos expostos ao Zika vírus. Entrei em contato com vários pesquisadores  que estão pesquisando diferentes aspectos do Zika vírus e descobri que já há 5 relatos de gêmeos discordantes: um deles apresentou microcefalia e o outro não. Isso fala a favor de um componente genético, talvez “protegendo” bebês que foram expostos ao Zika vírus de desenvolver o problema. Mas como ninguém está fazendo estudo genético dos bebês afetados vamos tentar contribuir com a nossa pesquisa. Vamos analisar  o genoma de gêmeos e também de uma amostra de bebês que nasceram com microcefalia em comparação com bebês normais. Temos duas perguntas básicas: 1) Existe uma susceptibilidade genética favorecendo ou protegendo o aparecimento da microcefalia? 2) Como o vírus age no genoma para causar a microcefalia?

MVP – Quais os desafios encontrados para empreender essa pesquisa?

MZ – Tenho tido uma receptividade enorme por parte de todos os pesquisadores que contactei para nos ajudar nessa causa. Já formamos uma rede importante. Os desafios agora são conseguir verbas suficientes para desenvolver a pesquisa. Estudos genômicos infelizmente têm alto custo.

MVP – Em sua opinião, no caso de haver a comprovação de que o vírus provocou sequelas neurológicas no feto, a opção de interrupção da gestação deveria ser um direito da mulher gestante?

MZ – Com certeza. Essa decisão tem que ser da mãe gestante. Será dela todo o ônus de lidar com uma criança que terá déficit cognitivo importante e talvez outras sequelas como cegueira ou malformações. Isso tem uma repercussão enorme em todo o núcleo familiar.

MVP – Essa pesquisa poderia vir a ajudar no desenvolvimento de uma vacina?

MZ – Não diretamente, mas talvez indiretamente. Se pudermos definir de antemão se uma gestante infectada corre o risco ou não de ter um feto com   microcefalia, isso já será uma grande ajuda.

Liége Lise é psicanalista, membro do Instituto da Psicanálise Lacaniana – IPLA-SP.

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