Por Jorge Forbes
A psicanálise sabe que o sofrimento por uma qualidade pode ser maior que aquele originado por um defeito, pois o defeito é solidário e a qualidade é solitária
Entre elogiar os talentos, por um lado, ou as histórias de superação, por outro, a imprensa brasileira deu clara preferência às histórias de superação, nesses Jogos Olímpicos do Rio.
Mal sabíamos qual era o esporte do atleta, de tanto que nos informavam, a todos nós espectadores, de suas dificuldades familiares, de sua penúria econômica, ou de suas antigas lesões orgânicas. Todas elas ultrapassadas com esforço, dedicação e disciplina exemplares. Por que essa preferência? Por que não dar peso semelhante ao sorriso maroto do talentoso corredor, em relação aos seus esforçados adversários esportivos? Provavelmente porque o esforço é democrático e o talento não. As histórias de superação são contadas com o objetivo de dar a ideia que as conquistas dependem em primeiro lugar do seu próprio esforço, que elas são meritocráticas. Somos todos iguais, a priori, as chances são equivalentes, só nos diferenciamos pela vontade e pelo esforço. Os talentosos, por sua vez, ficam relegados ao banco das injustiças divinas, pois eles têm uma vantagem que escapa ao mérito. O talento é uma vantagem não democrática.
Ledo engano, no entanto, pensar que a conquista por mérito é mais valiosa que a conquista pelo talento. Aqueles que assim pensam, não sabem o custo que uma pessoa paga para se responsabilizar pelo próprio talento. A primeira das faturas é a da exclusão do grupo, pois o talentoso é bicho raro e acaba não tendo lugar na turma.
A psicanálise sabe que o sofrimento por uma qualidade pode ser maior que aquele originado por um defeito, pois o defeito é solidário e a qualidade é solitária.
Parabéns aos superados, mas também, parabéns aos talentosos.
Jorge Forbes é psicanalista.
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