Por Elzira Uyeno
Premiada por sua luta pelo direito das meninas à educação, a jovem paquistanesa Malala Yousafzai não renega a sua cultura, mas defende o direito inalienável de morrer pelo que lhe é mais caro
Em janeiro, a jovem Malala Yousafzai recebeu o Prêmio Simone de Beauvoir 2013 por sua luta pelos direitos humanos e pelo direito das meninas à educação. Não se trata de uma abnegada professora, e os antecedentes que levaram à sua premiação não foram felizes – a adolescente foi baleada em um ataque reivindicado pelo grupo armado Taleban.
Malala foi atingida por um tiro ao caminhar para escola, no Paquestão. Mas não se tratava, como o mundo veio a saber, de um incidente de áreas de conflito armado. A jovem sofrera um atentado por ter ousado o que muitos outros não tiveram coragem: fazia campanha pela educação das meninas em seu país.
Numa época que presencia o declínio dos significantes mestres, das grandes certezas que conferiam segurança, sua atitude pode ser tomada como um dos novos sintomas da pós-modernidade da autoexibição. Malala tornou-se conhecida em 2009, aos 11 anos, quando assinava o blog “Diário de uma Estudante Paquistanesa” na BBC Urdu, site da BBC para o Paquistão. Ao persistir com seus escritos, mesmo sob os ecos da destruição, ela demonstrou acreditar na morte superior àquela biológica a que todos e sobretudo aqueles que vivem em áreas de guerra estão sujeitos: na que Lacan chamou de S1. Sua questão não era morrer biologicamente, mas honradamente.
Nesse caso, não se trata da honra em seu sentido de ato nobre, memorável e condecorável, mas daquela que recobre a vergonha que toca o sujeito no que lhe é singular, no que lhe é mais caro e pela qual a vida tem valia. No caso de Malala, o que que ficou nela grafitado – e que a biologia não reconhece –, que lhe é íntimo e faz toda diferença (Forbes, 2003) se manifestou em suas mensagens no blog.
Como a pesquisa conduzida por Alain Tourraine (2010) em “O Mundo das Mulheres” concluiu, ao contrário do que o senso comum imagina, nem todas as mulheres muçulmanas consideram sua cultura opressora e almejam a liberdade ocidental; assim como as ocidentais – leia-se tal como todas as mulheres, como postulado por Lacan – as muçulmanas encontram formas singulares de se subjetivarem. Malala não refuta a sua cultura, mas defende o direito inalienável de morrer pelo que lhe é mais caro: o direito à educação.