Por Evandro Limongi Marques de Abreu
Não adianta a busca por uma explicação, um sentido, um saber tão redondo quanto a bola
Diz-se que futebol, tal qual política e religião, não se discute. Ao menos quanto ao futebol, concordo. Não adianta a busca por uma explicação, um sentido, um saber tão redondo quanto a bola, nos resultados tantas vezes esdrúxulos das partidas.
Pode-se num insucesso qualquer colocar a culpa em quem se queira, pois a escolha é vasta e livre: nos árbitros (“tinha que ser aquele impedimento ou toque de mão ou pênalti ou acréscimos…”), no desempenho pulmonar da torcida, na preparação física e na garra dos atletas, no craque excepcional no time do adversário. Tudo em vão! Fala-se até nas famosas “zebras”, partidas em que, apesar da superioridade técnica de um time, outro sem tanto domínio dos fundamentos do jogo vem a fazer melhores passes, envolve o adversário, neutraliza o que tantas vezes se ensaiou, faz aquele gol salvador.
Cabe daí apelar à sorte ou ao azar? A contusão no treinamento da véspera, um mal-estar repentino, um estiramento no pique, uma “furada” monumental, um goleiro adversário que pega todas as bolas, o chute que tira lasca de tinta da trave, que explode lindamente no travessão, ou aquele “frango” inesquecível (“quem ensaboou a bola?”) não trazem resposta que satisfaça. Mandinga da boa? Nem pensar, ou, parafraseando o saudoso João Saldanha, acabariam os times todos sempre empatados. “Aqui é o país do futebol”, cantaram Milton Nascimento e Fernando Brant. No futebol – na vida levada ao gramado – o que mais se vê é a surpresa e o acaso, a desafiar, sem pudor algum, o certo, o desde então estabelecido, a “escrita”, as estatísticas. E haja fair play! A questão assenta-se bem na verificação daquilo que o inesperado traz e do que ele sempre requer…
Primeiro, que o melhor jogador do adversário não pode ser marcado por nenhum zagueiro, mesmo o mais habilidoso e combativo, visto tratar-se do Real, que está no campo todo, até naquela falha do tapete verde, o tal do “montinho artilheiro”, e não só ali, na curva da bola que conduz ao estufar da rede em mais um GOL! Segundo, que a responsabilidade, intransferível, é de cada um, nas falhas e erros (sobretudo nos olvidados), nas surpresas, nas estranhezas, no acaso que deixa bocas abertas e mãos levadas em desespero às cabeças. E aí nada de desculpas! Da vergonha à responsabilidade e desta à invenção, como diz Jorge Forbes, é o rumo a se tomar, antes que o Real, num drible de gênio, desconcertante, nos deixe sentados em campo, atônitos.
Evandro Limongi Marques de Abreu é psicanalista, advogado e professor universitário