Por Lisiane Fachinetto
Um diagnóstico clínico que não considere a singularidade do paciente se assemelha mais a uma sentença do que a um dispositivo essencial para o tratamento. Quando há um encontro entre médico e paciente, o diagnóstico deixa de ser sentença e se torna arte
Um estudo realizado por médicos do Dartmouth College, no Reino Unido, e publicado pelo British Medical Journal em novembro aponta algo que muitas pessoas vivenciam na prática, mas muitos médicos parecem ignorar: os doutores não consideram os pontos de vistas do paciente na hora de fazer um diagnóstico, e não escutam o que eles têm a dizer sobre si e sobre seu sofrimento. O estudo critica esses diagnósticos “silenciosos”, que estão sujeitos a equívocos e são prejudiciais tanto para o médico quanto para o paciente.
Um diagnóstico clínico que não considere a singularidade de cada um pode estar mais para uma sentença do que para um dispositivo essencial para o tratamento. O médico, munido de um “saber científico”, parte para um enquadramento do sujeito na classificação das doenças, que tem como referência os manuais e tratados médicos, como o DSM 5 e o CID 10, que especificam as doenças e seus sintomas. Sentença porque o médico define, estandardiza e classifica o paciente como um objeto de mercado, não coloca em questão qualquer possibilidade de troca. Não há subjetividade nem da parte do médico nem do paciente.
Na mesma pesquisa, os estudiosos também afirmam que para ocorrer a redução dos erros de diagnóstico é necessário mudar a postura do médico e o processo de etapas da realização de um diagnóstico. Os autores sugerem que o profissional adote uma atitude de distanciamento científico; use dados para descobrir qual é a preferência real do paciente; e envolva o paciente em uma tomada de decisão compartilhada sobre o seu tratamento. A mensagem é clara: os médicos não podem decidir tudo sozinhos.
As recomendações dos pesquisadores são um princípio orientador do trabalho dos psicanalistas. O analista lacaniano inclui a singularidade nos diagnósticos na medida em que não enquadra o paciente numa sintomatologia nosográfica preestabelecida. No entanto, busca pinçar os modos de satisfação do sujeito, ou seja, identificar a forma singular de relação que o sujeito estabelece com o seu desejo e gozo.
Prognóstico e diagnóstico são indissociáveis. Como o diagnóstico, o prognóstico de um psicanalista não está preso a uma prescrição, nem limitado a certo tipo de “estrutura” clínica. É preciso haver demanda de tratamento, uma aposta do sujeito no sentido de sair de sua queixa e trabalhar para se reinventar, ou seja, é necessário que o sujeito se implique no seu tratamento. Nesse sentido, podemos considerar que para fazer o diagnóstico é preciso um encontro, do analista e analisando ou do clínico com o paciente, o que implica incluir a singularidade de cada um, bem como considerar cada caso na sua especificidade. O médico precisa estar disposto a deixar esse encontro acontecer. O diagnóstico recobra assim o status de uma arte, como foi consagrado no juramento de Hipócrates.