Prato feito 10/09/2014

Por Italo Venturelli

Temos uma insistência em dar sentido e buscar garantias a tudo para fugir da angústia das escolhas e decisões, tipo prato feito.

Prato feito é um termo conhecido em nosso país e significa um tipo de comida simples que é servido em bares e restaurantes a preços módicos, compostos de alguns ingredientes tipo: arroz, feijão, abobrinha, ovo e carne moída. A questão é que ele já vem pronto, com os ingredientes em quantidade padrão e normalmente servido morno. Alguém fez o prato, independentemente de quem vai comer. É isto e pronto! Das suas preferências: esqueça!

Deparamos-nos diariamente com pratos feitos. Dietas, tratamentos milagrosos, medicamentos infalíveis, rituais religiosos, condutas e comportamentos politicamente corretos. Para o freguês, basta seguir as instruções. Aqueça bem, siga os passos,  engula com água e apazigúe suas inquietações. Olha o prato feito aí freguês! As promessas são muitas, porém os resultados podem não corresponder ao prometido. Mas para tudo tem-se uma explicação: é que você não aqueceu bem, ou não guardou adequadamente ou não seguiu corretamente a forma de uso.

Recentemente me deparei com a matéria intitulada, “Por que você dever subornar seu filho.” Conduta aconselhada aos pais, para fazer as crianças consumirem alimentos saudáveis. Desta forma concluem: diante das ameaças e riscos à saúde no futuro, “temos pessoas fazendo as escolhas certas agora, que produzirão os resultados certos no futuro.” A matéria foi publicada após o episódio de podscast “Freaknomics Radio”, noticiado pela Folha UOL.

O medo não é um bom conselheiro. Lacan em o Triunfo da religião antecipava, que hoje em dia até os cientistas têm medo: “avoir les foies”. A análise, segundo ele, cuida das coisas que não funcionam. E o Real na psicanálise é aquilo que não funciona. Convida a invenção responsável. Temos uma insistência em dar sentido e buscar garantias a tudo para fugir da angústia das escolhas e decisões, tipo prato feito.

A vida não é mesa servida, nem prato na mão. A noite tem lua nova e escuridão. Arriscar-se dá trabalho. Buscar os ingredientes, fazer ao seu gosto, responsabilizar-se pelos resultados, pede escolha decidida. Mas o gosto é outro. A digestão também!  Melhor “assuntar” bem, como diz o mineiro, que nunca vai a um lugar pela primeira vez, ele já deu um jeito de saber, ou de conhecer antes, que é pra “móde” não perder tempo, no caso em questão, com “receita” nada palatável.

Italo Venturelli é neurocirurgião e psicanalista.

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