Por Maralice Neves
Cirurgias para aumento das mamas se popularizam entre adolescentes, que buscam na modificação corporal uma forma de obter felicidade
Adeus festas de arromba, valsa à meia-noite e vestido “bolo de noiva”. O que as debutantes modernas querem é ter os seios turbinados. Ao menos segundo reportagem de capa da revista IstoÉ 2253, sobre as cirurgias de aumento de mamas. A revista mostra depoimentos de médicos renomados, e eles não se surpreendem mais ao se deparar, em seus consultórios, com adolescentes que pedem próteses de silicone como presente de 15 anos. Os volumes usados antigamente variavam em torno de 150, 200, 220 mililitros. Hoje, o mais comum, 280, 300, 350 mililitros e, em alguns casos, até um pouco maiores. No Reino Unido, meninas de 11 a 15 anos já sentem vontade de se submeter à cirurgia íntima, conforme dados do Serviço Nacional de Saúde Britânico.
Na busca irrefreável por cirurgias plásticas, o corpo das jovens fica entregue ao gozo sem freios. Nas palavras de Lacan, na Conférence et débat du Collège de Médecine à La Salpetrière , em 1966, “um corpo é algo feito para gozar, gozar de si mesmo”. Quando o corpo se torna o espaço sem limite da fantasia, como parece ser o caso dessas adolescentes – que desejam aumentar as mamas quando elas estão em pleno período de crescimento –, passamos a viver no paradoxo que nos apontou Gilles Lipovetsky em palestra no IPLA em 2008: “Os corpos são livres, mas a miséria sexual se mantém“. Passa a ser cada vez mais difícil suportar o corpo libidinal, particular e singular, na medida em que se busca irrefreadamente, no corpo biológico, o modelo exibido pelas técnicas cirúrgicas a ultrapassar os limites da própria biologia.
O cirurgião plástico se depara com o paradoxo apontado por Lipovetsky ao se encontrar investido do poder de orientar as pacientes e evitar exageros. Assim, beneficiando-se da indústria do narcisismo e do hiperconsumo ilimitado, este se vê enredado no curto-circuito da palavra. O que dizer às pacientes infelizes com seus corpos? Qual é o nome ou a quantidade da sua felicidade? “A identidade humana é frágil, flexível, responde ao ambiente, para o melhor e para o pior. Quando o ‘tudo pode’ se instala, traz consigo a indefinição das fronteiras corporais, do limite: do quem sou eu, do quem é você”, diz Jorge Forbes.
A falta de limites “exige de cada um o exercício de seu próprio limite, que hoje em dia vem menos da ’natureza‘ do que da própria escolha responsável”, continua Forbes. E completa: “É aquilo que eu quero que me restringe, e não o que o outro, o tempo, por exemplo, me impede de conseguir”. Portanto, diante dos apelos da cosmiatria e dos ideais padronizados de um corpo perfeito, cabe a cada um suportar o que do corpo escapa a justa medida e escolher um modo, singular, de obter a própria satisfação como seres sexuados e de desejo.