Por Claudia Riolfi
Para transmitir as competências nas quais um saber-fazer está em jogo é preciso ter, previamente, desenvolvido as habilidades
Os resultados do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (ENADE) – que integra o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES – estão repercutindo bastante nos meios especializados (ou não) ao longo desta semana. Após sua divulgação, muitos estão se dizendo alarmados com a formação precária dos futuros professores brasileiros. Terão razão em suas preocupações?
Infelizmente, parece-nos que sim. O exame (criado pela Lei nº. 10.861, de 14 de abril de 2004) tem como objetivo aferir o rendimento dos alunos dos cursos de graduação. Em outras palavras, serve, ao menos hipoteticamente, para mostrar o quanto os graduados aprenderam de modo efetivo os conteúdos, habilidades e competências que deveriam ter aprendido.
Consultando os documentos oficiais, vemos que o ENADE avalia os participantes “em relação aos conteúdos programáticos previstos nas Diretrizes Curriculares Nacionais de seus respectivos cursos de graduação; suas habilidades para ajustamento às exigências decorrentes da evolução do conhecimento e suas competências para compreender temas exteriores ao âmbito específico de sua profissão, ligados à realidade brasileira e mundial e a outras áreas do conhecimento”.
Não querendo entrar, aqui, no mérito da qualidade da prova (que, afinal de contas, sempre pode ser mal feita), entende-se porque os dados do ENADE 2011 apontam que os concluintes de cursos de licenciatura, em geral, e em pedagogia (uma carreira que recebe das universidades mais de cem mil novos profissionais por ano) foram bem mal nas provas de “formação geral”. Obtiveram, por exemplo, notas inferiores aos dos concluintes das áreas de engenharia e tecnologias, que realizaram essa prova.
Na prática, o que isso significa? Significa que, ao longo de quatro ou cinco anos de estudos, os futuros professores não desenvolveram, a contento, as habilidades que seus alunos precisarão aprender: mais especificamente a compreensão de textos e a resolução de problemas. Aí é preciso olhar mais de perto.
Ao contrário dos conteúdos livrescos, que podem ser repassados, inclusive, por quem não os domina, interpretar e raciocinar criativamente são competências nas quais um saber-fazer está fortemente implicado. Assim como andar de bicicleta, cozinhar ou bordar, quem aprende precisa, em maior ou menor medida, colocar o seu corpo em jogo na execução da tarefa. Analogamente, quem ensina não pode se limitar a dizer como se faz, precisa recorrer à mostra: dar a ver o que deve ser feito.
O pulo do gato está, portanto, nas provas que devem ser dadas na formação dos formadores de professores. Relatórios de pesquisa de mestrado e doutorado não podem mais ser suficientes para validar um percurso de formador. É preciso, com urgência, repensar os mecanismos de nossa práxis.
Claudia Riolfi é psicanalista, cursou pós-doutorado em Linguística na Université Paris 8 Vincennes-Saint-Denis. Professora na Faculdade de Educação na Universidade de São Paulo. Diretora Geral do IPLA