Obesidade infantil: culpabilizar ou responsabilizar? 24/09/2015

Por Maria da Glória Vianna

A obesidade infantil tem aumentado ano após ano em vários países, inclusive, no Brasil. Desde o ponto de vista da psicanálise, podemos entender que esse sintoma alude a outra fome, que se expressa pelo gosto de alimentos que engordam

“Pais deveriam ser punidos pela obesidade de filhos”? Este foi o título de um artigo publicado pela BBC News, de autoria Justin Parkinson, em 18/02/2015. O artigo da BBC explica que está debatendo a possibilidade de multar pais com filhos obesos. O que se perfila nessa proposta é a ideia de que os pais estejam sendo relapsos no cuidado com os filhos. Será que multá-los os tornaria mais atenciosos?

O tema é instigante. A obesidade infantil tem aumentado ano após ano em vários países, inclusive, no Brasil. Desde o ponto de vista da psicanálise, podemos entender que esse sintoma alude a outra fome, que se expressa pelo gosto de alimentos que engordam.

Sabemos que, atualmente, a configuração das famílias mudou. É cada vez maior o número de pais e mães que trabalham o dia todo, mas isso não justificaria o fato de terem se omitido de organizar um cardápio com os cuidadores ou instituições que recebem a criança. Dentro do seu orçamento e tempo, cada família pode encontrar formas criativas para lidar com a alimentação de seus filhos. A alimentação pode ser vista como um momento propiciador de descoberta de sabores, cheiros, comparações de textura etc.

Um dia, ouvi de uma mãe que vez ou outra ela levava seus filhos para lancharem fora. Ela não os proibia de escolher o lanche. Mas, querendo mantê-los longe dos excessos, já planejava o “antes e o depois”. Ela disse: “- Sabe, se sei que eles vão pedir, por exemplo, algo muito calórico, já imaginando a situação, ou vou dar uma volta a pé com eles antes de voltar para casa ou, ainda, paro o carro um pouco mais longe”!

Ter um filho doente excede ao preço de qualquer multa. Uma pessoa que paga, em dinheiro, por sua omissão, sente-se aliviado de sua culpa, mas não de sua responsabilidade. Entendemos que imputar culpa a alguém não leva a nada. Os interessados precisariam realizar um trabalho de responsabilização dos pais. A culpa leva os pais ao martírio, mas não fornece combustível para a ação implicada. Para tanto, é necessário assumir o lugar de pai ou de mãe desde o qual a pessoa se sente responsável pela saúde física, mental e psíquica dos filhos que decidiu ter.

É necessário compreender que a obesidade infantil é um sintoma dos pais que se manifesta nos filhos. Ele revela que algo não vai bem na família. Quando os pais não lidam com seus excessos e omissões, os filhos acabam se tornando depósitos dos efeitos das dificuldades paternas. 

Maria da Glória Vianna é psicanalista, mestre em linguística pela PUC e membro do Corpo de Formação do IPLA.

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