Por Emari Andrade
Quem decide iniciar uma formação é chamado a escolher em qual lugar quer se inscrever: o do “ser mais um” ou o do “quem faz a diferença”
Em 25 de fevereiro, se iniciarão as aulas do Corpo de Formação 2013 do Instituto da Psicanálise Lacaniana – IPLA. No momento em que várias pessoas renovam seu compromisso com esta instituição, vale interrogar os motivos por que fazem isso. Afinal, quem deseja iniciar uma formação como psicanalista não tem dificuldades para, em um clique, encontrar o que procura. Em São Paulo, por exemplo, as opções são muitas. Como se decidir?
Para nós, mesmo que tudo varie, um princípio básico precisa nortear a formação do psicanalista: um laço pautado na responsabilidade sexual. Para Lacan, a relação que se estabelece em um laço social é formativa. Tem um potencial de transformação para os sujeitos que dele participam. Assim, cabe a cada qual, antes de ingressar em uma instituição, decidir se quer ser permeável aos efeitos desse laço. Caso não o faça, vai se tornar “mais um aluno”, limitando-se a marcar presença física em um lugar.
Aquele, porém, que deseja “fazer a diferença” e “passar para outra coisa” – remetendo aqui ao que Allouch (1995, p.7) define como alguém que tem “saúde mental”, ingressará na instituição implicando o seu corpo na direção de se beneficiar do que Lacan nomeava como “ensino verdadeiro”: aquele que ensina o sujeito a, com relação a sua singularidade, “nomear, argumentar, fazer passar para a existência” (LACAN, 1954-555, p. 309).
Em suma: para valer a pena o ingresso em uma instituição psicanalítica, é necessário que cada aluno se responsabilize por seu desejo de se tornar um analista. Forbes (2012) argumenta que frente aos desafios da sociedade do século XXI, a responsabilidade psicanalítica é a única ética possível para o futuro da sociedade. Tal responsabilidade em nada se confunde com o “cumprir com obrigações morais”, mas incide sobre a sexualidade, ou seja, envolve um estado integral de implicação corporal com a causa psicanalítica.
Implicar-se na formação psicanalítica requer disciplina para estudo rigoroso, curiosidade pelas criações e manifestações do ser humano, análise pessoal constante e desapego narcísico para poder retroagir sobre as próprias produções. Mas, todos esses elementos serão periféricos se a pessoa estiver firmada no princípio básico de não vacilar frente aos desafios que a própria formação exige. Quem se envolve integralmente não leva em conta o tempo cronológico, os dias letivos, o espaço geográfico ou qualquer outra coisa que não a responsabilidade por sua formação e por honrar o legado deixado por aqueles que fundaram a psicanálise.
A psicanálise é fruto do amor de Freud, Lacan e outros homens que trabalham para “ressignificar”, a cada época, o amor pelas manifestações do psiquismo humano. Sendo fruto de amor, cabe lembrar a letra de Márcio Borges e Beto Guedes que diz que “Sim, todo amor é sagrado e o fruto do trabalho é mais que sagrado”. A formação do psicanalista não envolve a sacralização da psicanálise, mas um movimento íntimo de responsabilidade por seu futuro, para que não caia no campo da banalização.
Para ler mais:
ALLOUCH, J. Letra a Letra: transcrever, traduzir e transliterar. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 1995.
BORGES, Márcio e GUEDES, Beto. Amor de Índio. Long Play: Amor de Índio. EMI-Odeon, 1978.
LACAN, Jacques (1954-1955). O Seminário. Livro 2: o eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 2ed, 2010.
FORBES, Jorge. Inconsciente e Responsabilidade. São Paulo: Manole, 2012.