O professor de inglês e o sem palavras 25/09/2014

Por Claudia Riolfi

Comentário sobre a dissertação de mestrado intitulada “O ensino da língua inglesa na escola pública: uma leitura psicanalítica do gozo”

Quarta-feira, 24 de setembro, Marilene Pereira de Oliveira defendeu a dissertação de mestrado intitulada “O ensino da língua inglesa na escola pública: uma leitura psicanalítica do gozo”, na Faculdade de Letras da UFMG, em Belo Horizonte. Marilene, que cursou uma das turmas da modalidade online do curso “Enfim, a Psicanálise no Divã”, e frequentadora assídua dos sábados no IPLA, foi orientada pela Profa Dra Maralice de Souza Neves, também ligada ao Instituto da Psicanálise Lacaniana. Estive na banca e adorei o que li.

Enfim, a novidade está no ar! Marilene teve o propósito de contribuir para que formadores e professores possam problematizar seus caminhos profissionais, questionar seus modos de satisfação, seus desejos, sua implicação perante a profissão.

Enquanto sete entre dez pesquisas no campo da educação privilegiam os impasses, dificuldades e reclamações dos profissionais de educação, a moça ousou: visou a identificar os possíveis indícios de gozo vivificante dos professores de Língua Inglesa de escolas regulares públicas.

A pesquisadora procurou e achou pessoas que, apesar de queixas ao seu redor, de suas dificuldades ou mesmo infortúnios, se mantêm animadas e implicadas com o ensino. Acreditando que a psicanálise tem sua contribuição a oferecer ao formador e ao professor de línguas estrangeiras, escolheu, para o seu trabalho, enunciadoras que, aparentemente, estariam vivificados pelo gozo feminino.

Lendo seu trabalho, é possível vislumbrar o que impulsiona o profissional da educação, a continuar a ensinar em determinados contextos sociais considerados pouco favoráveis e como se dá o seu posicionamento no processo do ensino em escolas públicas. Seguindo as peripécias da pesquisa, vemos a configuração de uma economia psíquica do professor de inglês como língua estrangeira que se mantém firme em seu propósito, não sucumbindo ao discurso corrente da queixa e do pessimismo que parece contagiar alguns professores de escolas públicas no Brasil.

O que ela descobriu ao entrevistar essas mulheres? O fato de que elas conseguiram fazer, da sala de aula, um lugar para sair de um lugar passivo (exposto ao objeto de sua satisfação) para ocupar um lugar ativo (de quem consegue usar o seu objeto de satisfação em benefício próprio). No caso, mais especificamente, estamos falando do objeto “voz”.

Ao relatar a história de seu encontro com a língua estrangeira, todas as informantes narraram o júbilo sentido por elas ao se deparar com os sons de uma língua desconhecida. Seu grande barato era, justamente, não entender nada. Se, na língua portuguesa, estavam presas aos significados partilhados, na inglesa, podiam se abrir para a brincadeira, para o puro jogo significante enquanto algo que oferece um prazer quase musical.

Na escola pública, povoada por alunos que nunca se encontraram com língua estrangeira, elas podiam, ao ensinar, presenciar, nos aprendizes, a ocorrência da mesma satisfação que haviam experimentado na sua infância.

Concluindo, Marilene encontrou um curioso e belo paradoxo: foi bem-sucedido em ensinar a língua estrangeira quem se abriu ao sem palavras. Aprendamos com ela.

Claudia Riolfi é Professora Livre-docente da Universidade de São Paulo. Cursou pós-doutorado em Linguística na Université Paris 8 Vincennes-Saint-Denis. Psicanalista, é Diretora Geral do IPLA.