Não existe relação sexual 13/02/2014

Por Jorge Forbes

Por mais que se queira nunca haverá a justa relação, a perfeita acoplagem entre os amantes, pois sempre fica uma sobra

Não existe relação sexual. Não, essa não é uma péssima notícia, é só uma provocação.

Foi com essa frase que o psicanalista Jacques Lacan tumultuou a sensibilidade da intelligentsia francesa nos anos 70. Claro que não faltou quem imediatamente dissesse que o famoso seguidor de Freud dizia isso porque estava avançando na terceira idade. Risos. Mas o fato é que essa aparente bobagem, nos impacta: -“Como assim, não existe relação sexual? O que quer dizer essa declaração esdrúxula?” Por mais estranha que possa nos parecer tal afirmativa, ela não o é aos nossos sentimentos. Se a nossa razão objetiva a repugna, a nossa razão sensível nos diz que há uma verdade nessa frase.

Revelemos o mistério: a frase não é para ser entendida como que não exista um encontro sexual entre dois parceiros que se querem, ela diz que por mais que se queira nunca haverá a justa relação, a perfeita acoplagem entre os amantes, pois sempre fica uma sobra. Semelhante a uma conta de dividir imperfeita que deixa um resto. Nenhum motivo para desespero, deixar um resto é animador, pois é o que incita a novas e repetidas tentativas. Se não existe a relação sexual, temos um motivo a mais de fazê-la existir, nem que seja por um breve momento que de tão fugidio nos deixa o gosto de quero mais, e mais, e mais. Lacan dizia encore, encore, encore, jogando com a homofonia da palavra francesa “encore” – ainda – com a expressão “en corps” – no corpo. Algo no corpo fica pedindo mais ainda.

A este aspecto da não existência da relação perfeita sexual, se soma outro, igualmente provocador: “Se já sei que algo não vai dar certo, para que insistir?” Assim pensa o esperto. Ele é um precavido do amor. Do lado homem, ele dissocia a atração sexual, de amor, diminuindo – assim imagina – a perda inevitável. Do lado mulher, ela pede tantas garantias para um futuro perfeito, que inviabiliza o presente que tem. Tão espertas quanto inúteis soluções. Fato é que uma boa dose de bobice é necessária a qualquer amante. Bobice porque apesar de saber que o erro faz parte do amor, isso não diminui o entusiasmo. Errou? Tenta de novo e de novo, sem medo de ficar bobo, sem medo de dizer: – “Você me deixa abobado”. E isso é bom.

Jorge Forbes é psicanalista. Artigo publicado originalmente na revista Gente IstoÉ, edição de janeiro/fevereiro de 2014