Mira de caolho 07/05/2015

Por Evandro Limongi Marques de Abreu

Neste momento de crise, de desbussolamento, para usarmos um termo de Jorge Forbes, surgem no cenário político atores que se oferecem a desempenhar figuras paternas dispostas a desempenhar o papel de “salvadores da pátria” e reestabelecer uma ordem supostamente perdida

Um projeto polêmico está tramitando na Câmara dos Deputados e, apesar da mobilização por  parte principalmente de juristas contra sua aprovação, tem chances de passar pelo parlamento.   Trata-se da Proposta de Emenda Constitucional 171 de 1993 que  pretende reduzir a maioridade penal para 16 anos de idade.

Estamos sob fogo cerrado! De um lado, tem-se a criminalidade, violenta ou não, mas essencialmente urbana, com ataques à vida e à propriedade  que parecem ser obra de monstros que transformam as cidades em palco de horror. A criminalidade não-violenta, por outro lado, desafia os poderes político, econômico, e social, uma vez que está voltada ao enriquecimento  com espoliação dos recursos públicos. Clama-se por mais segurança pública ante tanta violência.  Quer-se  o controle social proporcional ao medo que a mídia, sobretudo a televisiva, incute numa população que se vê culta, informada e entendida.

Partir de onde num país imenso em que todos os desafios são de tal monta que,  nas questões das políticas públicas de segurança,   não se sabe por onde começar? A psicanálise tem muito a contribuir. Mas há que sair o analista do claustro e estar disposto a contribuir com escuta apurada e bisturis afiados. Neste momento de crise, de desbussolamento, para usarmos um termo de Jorge Forbes, surgem no cenário político atores que se oferecem a desempenhar figuras paternas dispostas a desempenhar o papel de “salvadores da pátria” e reestabelecer uma ordem supostamente perdida. Nada poderia ser mais desacertado.

Ora, nesse momento, em que precisamos de eficazes políticas públicas que possam  contemplar educação, esporte e arte, facilitar  o desenvolvimento de raciocínios, desafiar inteligências, fomentar solidariedade, contemplar condições de vida, permitir sonhos, abrir caminhos para que o desejo posso nos levar a fabulosas, escancaradas e incontidas ressonâncias criativas, encontramos no cenário político quem, ao invés disso,  alega, que a solução para a questão da violência urbana seria punir mais cedo, construindo mais cadeias, com penas mais severas, suprimindo direitos e garantias. É o cidadão que deve pagar pela lentidão de um Estado que não enxerga mais sequer os próprios pés?  Pobre Constituição!

Estamos num momento politicamente crítico,  no momento de escolha entre o projeto de um futuro policialesco, de força, de rigidez e obstinação ou de um projeto político  maior que envolva, insira, e inclua  a escuta e o debate de todos os aspectos da violência e da corrupção, em autêntica e desarmada cooperação. Ver a questão da criminalidade apenas por um ponto-de-vista, o da moral, da ordem e dos bons costumes, só demonstrará que quem tem um olho só não é rei de coisa nenhuma, mas caolho mesmo; e não tem mira para acertar o alvo! 

Evandro Limongi Marques de Abreu é advogado, professor universitário na área do direito e psicanalista em Curitiba – Paraná.