Por Liége Lise
para O Mundo visto pela Psicanálise
Natalia Spigolon quebra o estereotipo das lutadoras de Karate. Esbanja feminilidade, graça e simpatia. Preocupada em “fazer série”, inscreve-se na continuação da tradição do Karate, chama-se a responsabilidade na construção do futuro do esporte. Evidencia que o sucesso, tão preparado, surge como uma surpresa. Mostra que esportista de alto nível não se constrói só no treinamento técnico e no sacrifício: é na capacidade de amar, sair de si e se entregar e, além do controle do gesto técnico, poder se deixar invadir pela felicidade.
O Mundo – Quando nasceu sua paixão pelo Karate?
Sempre gostei de esportes e o Karate apareceu na minha vida quando eu tinha nove anos. Foi amor à primeira vista, comecei e nunca mais parei. Lembro-me até de uma vez que minha mãe me colocou de castigo e eu falava: “- só não me tira do Karate”. (Risos) OM – Como você define o Karate?
Para mim, o Karate é esporte, arte marcial e filosofia de vida. Eu vivo o esporte, comecei como uma arte marcial e levo os princípios do Karate como uma filosofia e inspiração de vida. OM – O que significa ser uma atleta, viver e existir do e no Karate?
Ser atleta é encontrar em algum esporte o prazer em se entregar. Hoje sou conhecida nacionalmente e com isso as responsabilidades aumentam. Tenho que de alguma forma representar, transmitir e passar adiante minhas experiências e o legado desse esporte. OM – Como se deu a conquista desse ouro?
Esse título foi uma construção. Não foi de um dia para o outro, foram 15 anos de muita disciplina e perseverança. Foram dez campeonatos Pan-Americanos de que participei para alcançar a primeira medalha de ouro na minha carreira na categoria individual. OM – Do Brasil para o mundo, como é ser uma medalhista de ouro?
É uma felicidade! Confirma que tudo o que você fez, valeu a pena.
OM – O que você destaca da sua participação e representação do Brasil nos Jogos Pan-Americanos do Canadá?
No Karate, na minha categoria até 68 kg, o Brasil é penta campeão. Isso mostra como o Karate brasileiro é forte e que há um trabalho sério e continuidade entre gerações. Os atletas estão conseguindo manter e/ou melhorar os resultados em comparação aos anos anteriores. E essa edição foi onde aconteceu o melhor resultado do Karate em toda a história dos Jogos Pan-Americanos. Os atletas do Karate fizeram uma excelente apresentação.
OM – Como você lida com a surpresa?
O esporte é fonte de inspiração e prepara para a vida. Vejo que para ser atleta preciso ter confiança, postura, coragem, lidar rapidamente com imprevistos e com obstáculos de uma maneira em que tenho que encontrar soluções e novas respostas. Quando ganhei os Jogos-Pan-americanos, tive uma reação de dar muitos berros, foram sem pensar, foi uma atitude, uma comemoração que fugiu do meu controle.
OM – Um amor do tatame para a vida. Diego Spigolon, técnico da Seleção Brasileira de Karate, é seu técnico e também seu esposo, como é essa parceria?
Eu conheci o Diego quando decidi treinar em Piracicaba. Fui à sua academia treinar e fazer um teste para ver se eles me aprovariam para compor a equipe Piracicabana. Desde o primeiro dia já senti admiração por ele, pela sua educação, simpatia, dedicação e por ser tão atencioso. Hoje somos casados, estamos juntos há cinco anos. Há muita cumplicidade, treinamos em qualquer lugar e a qualquer hora e dia, estudamos as adversárias e comentamos a respeito delas, sempre buscamos conciliar com a nossa vida fora do Karate, conseguindo tempo para passear, etc.
OM – Qual a influência dos aspectos subjetivos na formação de um atleta?
O atleta tem que trazer consigo características pessoais que são indispensáveis para o seu sucesso, como autoconfiança, persistência, humildade e, claro, disciplina. Tem também algo muito forte que envolve toda essa vontade, esse amor, parece algo escrito por Deus, foge à explicação.
OM – Diante das perdas e sucessos, como você cuida da sua cabeça?
Não é fácil lidar com a derrota, mas às vezes perder me faz ficar atenta aos erros. Por outro lado, a vitória faz com que eu me cobre mais para me manter e melhorar da última competição. Eu faço acompanhamento psicológico desde 2014.
Natalia Brozulatto Spigolon, atleta da Seleção Brasileira de Karate, medalhista de ouro nos Jogos Pan-americanos em Toronto 2015.