Frida e o olhar feminino 26/11/2015

Por Dorothee Rüdiger

Exposição Frida Kahlo – Conexões entre mulheres surrealistas no México – de 27 setembro 2015 a 10 janeiro 2016, no Instituto Tomie Ohtake, SP

Ela está causando. Longas filas se formam desde setembro desse ano no Instituto Tomie Ohtake para ver a exposição sobre sua obra e a das mulheres surrealistas no México.  Nenhuma surpresa, porque Frida Kahlo, a pintora que nasceu em 1907 e morreu em 1954,  tornou-se  ícone pop nesse início do século XXI.  Ela  sempre causou. Não se deixou abater pelas sequelas de um acidente e viveu uma vida fora de qualquer padrão estético e moral. Era uma mulher, no sentido lacaniano da palavra. Vivia a singularidade reinventando-se a todo instante em sua obra e estilo de vida.

A exposição leva o espectador ao mundo feminino de Frida Kahlo e de uma série de artistas que nela se inspiraram para, por sua vez, inventarem sua feminilidade em obras artísticas.   Em torno de quadros escolhidos de Frida Kahlo  a exposição reúne pinturas  raras  das artistas  surrealistas Rosa Rolanda, Maria Izquierdo, Remédios Varo, Cordélia Urueta, Leonora Carrington, Lola Alvarez Bravo,  Kati Horna, Bridget Tichenor e Alice Rahon. 

O que impressiona é ver, como  o olhar feminino de cada uma delas procura sua própria  identidade na arte. Autorretratos se revezam com paisagens surrealistas. Jogos de máscaras dizem da sedução.  Cenas de sonhos tentam dar conta do inconsciente feminino. Trajes, cartas e retratos fotográficos sobre a vida de Frida Kahlo e das pintoras surrealistas documentam a época histórica, na qual atuavam contra as convenções morais que davam à mulher um lugar subordinado na família, na política, na sociedade.   Elas contribuíram com sua arte para o rompimento com o senso comum que dava à mulher esse papel.

A exposição é delas e das múltiplas maneiras de se inventar como mulher.  O retrato dos homens tem, aqui e desta vez, um papel coadjuvante. Diego Rivera, companheiro de vida de Frida Kahlo aparece em fotos e retratos pintados pela sua companheira, ora com olhar assombroso, ora como protagonista do movimento comunista, ora  como bebê de colo abraçado pela “grande mãe” Frida.  Não há igualdade, justaposição entre marido e mulher,  menos ainda, harmonia. Há a presença de uma tensão incômoda entre os sexos.  Essa tensão produz criatividade e estilo, produz quadros que valem ser vistos por seus traços minuciosos e delicados e que são capazes de seduzir tantos   visitantes.

Dorothee Rüdiger é psicanalista e doutora em Direito pela Universidade de São Paulo

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