Dos nomes que despertam o amor 01/08/2013

Por Helainy Andrade

Os nomes de amor, os apelidos amorosos, são uma alusão. Por isso tocam. E se aludimos é para nos iludir, porque o amor pede uma dose de ilusão

Sigmund Freud nomeava como Liebesbedingung, – a condição do amor –, um traço ou características da pessoa amada que nos causa o desejo e nos desperta uma atração e um afeto impossível de explicar. Daí os apelidos amorosos, criativos e originais, serem mostras da criatividade e intimidade de um casal, expressão de graça e de alegria de quando estão amando.

Existem apelidos que ultrapassam a esfera do íntimo e ganham respaldo cultural. Ser chamada de “minha pulga”, na França, é elogioso. O parasita ficou associado à intimidade, no tempo em que a atividade – um tanto quanto prazerosa de retirar pulgas do outro – era um cuidado compartilhado apenas entre pessoas íntimas. No Japão, por sua vez, um rostinho oval, um ovo com olhos, causa fascínio aos homens. A mulher que recebe tamanho elogio se sente uma privilegiada.

Ah, o amor… decididamente, ele é impossível de ser colocado em palavras! Elas não dão conta de expressá-lo, mas são um recurso para chamá-lo. Deve ser por isso que os apelidos amorosos – por mais esquisitos e bobinhos que sejam para quem está fora daquele dialeto a dois – nos fazem sentir especialmente bem e, amados. Muito mais do que nos sentiríamos se chamados pelo nosso próprio nome. O que dizer daqueles apelidos que não encontram tradução ou correspondência com uma representação na realidade? Eles são poderosos, aguçam a fantasia. Portam o enigmático e misterioso do sentimento que nos liga ao outro.

Os nomes do amor, os apelidos amorosos, são uma alusão. Por isso tocam. Aludem a algo que tem uma conotação especial. E se aludimos é para nos iludir, porque também no amor, trata-se sempre de uma ilusão. A psicanálise conta que, em se tratando do amor, há uma ilusão em jogo. Mas que isso não leva necessariamente à desilusão, o que seria um pessimismo ou, pior, um cinismo. Ela, mais exatamente, retira da inocência e exige, assim, uma sustentação maior: uma coisa é você acreditar na ilusão do amor, outra é sustentar o amor com a ilusão que ele sempre vai portar.

Na prática é o seguinte: uma coisa é você ouvir que é uma princesa, outra é você acreditar que é mesmo. O equivalente para o príncipe ou deus grego também é verdadeiro. O fato é que qualquer nome – por mais amoroso que seja – não é para que você narcisicamente “se ache”.  No máximo, temos aí uma pista, daquilo que podemos ser e jamais saberíamos sem tal encontro.

Quando amamos, nos lançamos à experiência de dar ao outro aquilo que nos falta. Se nos sentíssemos completos não buscaríamos o amor. Se a palavra também falta para dizer do amor, a poesia e os apelidos são um artifício indispensável para chamar a Liebesbedingung, a condição que nos faz humanos demasiadamente humanos. 

Helainy Andrade é psicanalista em Varginha-MG e pesquisadora na Clínica de Psicanálise do Centro de Estudos do Genoma Humano da USP