Por Antônio Mathias Rüdiger Verona e João Francisco Rüdiger Verona
A internet nos entusiasma, já que nela a última fronteira não parece muito próxima de ser alcançada. Assim, estamos, por hora, felizes com as novas terras
A espionagem e o tráfego de dados, seja de governos, empresas ou de cidadãos comuns, estão na ordem do dia do cenário político. A psicanálise, desde Sigmund Freud, é sensível pelo “mal-estar na civilização”. Assim sendo, o Mundo visto pela Psicanálise não poderia deixar de dar sua contribuição para o debate das questões em foco na governança global. Por isso, ouviu dois jovens que se criaram no mundo informatizado e fazem dele sua plataforma política.
A internet é a grande terra-de-ninguém do nosso mundo pós-globalizado. Quebramos todas as fronteiras físicas que existiam para sua expansão e tivemos que inventar novas fronteiras. Está em nossas mãos a responsabilidade dela ser um faroeste selvagem, onde somente alguns poucos especialistas – dentre funcionários públicos e hackers – detêm seu controle ou um espaço realmente público. O espaço artificial criado para poucos está à beira de ser invadido por grupos cada vez mais organizados que nasceram e cresceram já sabendo o que acontece quando se clica “CTRL + ALT + DEL”. Sim. Sabemos que somos todos filhos e dependentes da grande “mãe” internet, uma natureza artificial criada à nossa imagem e semelhança, onde parece estar tudo sob o controle e a tutela dos dispositivos do “pai” Estado. Quase! O Estado sente-se impelido a “regular” devido aos “perigos” do excesso de liberdade, pois à “mãe” internet e ao “pai” Estado este novo universo pulsante e digital, no fundo, não pertence.
Nós, por muitos chamados de “sociedade civil mundial”, ousamos ser os donos desse grande bem coletivo, dessa nova maravilha do mundo, dessa nova torre de babel. Desta vez não é o céu o limite, mas a nossa própria capacidade imaginativa e intelectual de explorar cada canto deste tão jovem universo, que, como em Matrix, pode ser tanto nossa prisão quanto a libertação de nossas impossibilidades físicas. A internet nos entusiasma, já que nela a última fronteira não parece muito próxima de ser alcançada. Assim, estamos, por hora, felizes com as novas terras. Mas até quando?
A internet tem, sim, seus limites. Para o leigo parece que, um dia, a internet foi emprestada dos militares norte-americanos às universidades para realizarem suas pesquisas e daí, há 25 anos, aberta ao público e à sociedade civil global. No entanto, o acesso à internet não foi exatamente um empréstimo. Incialmente, foi o departamento militar norte-americano, a Agência de Projetos de Pesquisa Avançada do Exército (DARPA) quem criou uma rede para interconectar radares. Mais tarde, a rede foi aberta às universidades para pesquisa militar. Daí ela foi sendo aproveitada para outros fins e tornou-se um sucesso do público mundial. Mas isso não significa que não haja controle estatal. Hoje, em sua administração no nível mais elevado estão as organizações que definem os padrões operacionais da internet como ICANN e W3C. Só depois as organizações regionais e os estados nacionais entram na fila para terem algum acesso a decisões sobre a rede.
Tecnicamente, quem toma decisões são companhias de telecomunicação com os backbones (nacionais e regionais) que interconectam NAPs (pontos de conexão entre backbones e alguns ISPs – Internet Service Providers), as universidades, os provedores e por fim os usuários. Quando mandamos mensagens, não estamos conectados uns aos outros, mas sim a toda uma estrutura complexa. Enfim, para existir a “liberdade democrática” ou a horizontalidade na rede – que todos pensamos possuir – existem diversas hierarquias que a sustentam. Quando “googlamos” e “curtimos” usamos companhias americanas. Assim, o fluxo de dados pode passar pelos EUA, por território norte-americano. Além disso, os EUA exercem muito poder sobre as organizações reguladoras.
Sabemos de tudo isso. Como conquistar esse novo território enquanto espaço realmente de todos? Eis a questão. Ao final das contas, e isso é o nosso grande desafio político para o futuro, podemos contar com o nosso Estado ou com a Organização das Nações Unidas que administraria a internet em nome de todos? No atual cenário político, é uma solução difícil a se realizar. A responsabilidade também é nossa. Cabe a nós inventarmos, a partir da tecnologia que possuímos, nossos meios para que a internet não seja o terreno de poucos entendidos, mas sim, de fato, um novo espaço político da humanidade.
Antônio Mathias Rüdiger Verona é bacharel em Ciências da Computação e João Francisco Rüdiger Verona é estudante do curso de Jogos Digitais da FATEC