Da gula e do gosto 14/05/2015

Por Alain Mouzat

O que pode nos comandar hoje? A dieta, o ideal ou o gosto?

Nossa relação com a comida sempre incorporou uma outra dimensão do que a da simples satisfação de uma necessidade.

Do tabu à antropofagia, as mais primitivas sociedades já demonstravam que se trata de outra coisa.

Não vamos disfarçar: o que age para quem gosta de comer é a saciedade, ou o prazer de aplacar essa sensação de que falta algo, no endormecimento de um órgão, na satisfação do corpo, no prazer da boca, com múltiplas sensações das papilas…

Desde muito cedo se denunciou os excessos – “nada em demasia” já diziam os gregos.

Cada época teve seu meio de encampar nossas satisfações: a religião que chama de pecado (a gula), o século clássico que inventou a etiqueta, o século XIX que inventou a gastronomia (a comida elevada ao nível de arte para poucos).

Mas hoje, o que pode nos comandar? dietas e regimes em nome  do imaginário de um corpo perfeito? de um ideal de saúde? ou simplesmente de extrair da pulsão algo que fica como a expressão da singularidade mesma: o gosto. 

Alain Mouzat é professor da Universidade de São Paulo, doutor em linguística, e psicanalista membro do Instituto da Psicanálise Lacaniana