Por Maralice Souza e Liége Lise
Na eterna busca por soluções mágicas, estudantes usam Ritalina e Concerta para melhorar sua performance acadêmica e para substituir os “estimulantes” na balada
Qual é a lógica que leva as pessoas a tirarem proveito do diagnóstico de TDAH, ou Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, tão em voga hoje em dia? Muitas são as pesquisas que comprovam diagnósticos errados em crianças agitadas ou indisciplinadas na escola e que, ao iniciarem o uso de uma medicação, tornam-se convenientemente “obedientes” e “sossegadas”.
Quando pais, professores e familiares identificam os clássicos sintomas de TDAH citados pelos especialistas, como falta de atenção, impulsividade e excesso de atividade, pronto! Está lançada a suspeita do transtorno. E embora não haja consenso científico sobre as causas, nem exames de imagem que comprovem a existência do TDAH, é unanimidade na comunidade científica que o transtorno existe. Está registrado no CID 10 – Classificação Internacional de Doenças, 10ª edição, sob o item F-90. Basta alguém fazer o diagnóstico. Em seguida, a criança ou adolescente são medicados, e todos podem então ficar tranquilos. Será?
Jorge Forbes nos alerta em seu livro Você quer o que deseja? o quanto a época atual está marcada pela ideologia biologizante. Para ele, o carinho do avô que dizia “para tudo tem remédio” foi transformado em prescrição médica. Sob o efeito da Ritalina ou de Concerta, esperamos que o comportamento do “paciente” se modifique, sua concentração aumente, sua coordenação motora melhore e os seus impulsos sejam, enfim, controlados. Não se sabe mais lidar com o excesso de agressividade ou com a desatenção das pessoas. O remédio traz a solução. Porém, as terapias que se propõem a mudar o comportamento agressivo e melhorar a concentração certamente não miram no que a agressividade ou a desatenção expressam da subjetividade de uma pessoa.
A vida pede uma invenção de sentido singular e intransferível. Todos queremos uma vida feliz. Seria uma vida feliz aquela ajustada, obediente, de bem-estar e boa autoestima tanto na família quanto na escola? Se o medicamento proporciona esse efeito, por que passar pela angústia que a aprendizagem nos coloca? Recentemente, tivemos notícias de jovens interessados apenas em aumentar a capacidade cognitiva usando a Ritalina de forma ilegal, para aumentar a chance de aprovação no vestibular ou em concursos públicos. Eles querem o sucesso rapidamente e a qualquer custo. E os abusos não param aí. Como a Ritalina torna a pessoa extrovertida e melhora a capacidade de comunicação, jovens vêm usando o medicamento por diversão, para ficarem mais “ligados” na balada, independentemente das consequências.
Em uma cultura que, por vezes, passa a ilusão de que para tudo se tem remédio – literalmente, essas drogas até podem trazer a idéia do falso bem-estar. Porém, que ninguém se engane: há outros convites mais autênticos. Dentre eles, a aventura de escolher e se responsabilizar por um estilo único de estar na vida, e lançar para os comportamentos como agressividade e ou desatenção um olhar que não seja patológico, e inclua algo da estranheza humana, próprio de quem quer ser escutado e ganhar uma expressão mais feliz.