Sigmund Freud
Pode-se julgar, pela carta a Binswanger de 14 de março de 1920, a impressão que produziram em Freud estes dois acontecimentos reunidos – a enfermidade e a morte de Von Freund e, depois, a morte de Sophie.
Após receber o seu lembrete de ontem, perguntei-me: será possível que deixei sua amável e rica carta de 07 de janeiro sem resposta? Sim, é verdade, e isso se explica pelo triste conteúdo deste mês. Para começar, eu estava dia após dia sob a impressão da lenta agonia de um caríssimo amigo, que você poderá de fato descobrir no artigo necrológico da Revista 1920, n.1. Que naquele momento eu não pudesse escrever precisamente a você, você entenderá facilmente quando ficar sabendo que era precisamente a sua sorte que me mantivera na esperança por ele durante um ano e meio. Ele fora submetido à mesma operação que você, mas não pode evitar uma recaída. Nós o enterramos em 22 de janeiro. Na noite desse mesmo dia, recebemos um telegrama inquietante de nosso genro Halberstadt, de Hamburgo. Minha filha Sophie, de 26 anos, mãe de dois meninos, fora atingida pela gripe. Ela faleceu no dia 25 de manhã, após 4 dias de doença. Os trens estavam então parados e foi por isso que não pudemos nem mesmo ir até lá. Minha mulher, profundamente abalada, prepara-se agora para a viagem; mas as novas desordens na Alemanha tornam problemática a execução desse projeto. Desde então, um peso opressor pesa sobre todos nós, e sinto-o também em minha faculdade de trabalho. Nenhum de nós dois pudemos ainda superar esta monstruosidade: que filhos possam morrer antes dos pais. No verão – respondo assim também a seu amigável convite – queremos nos encontrar em algum lugar com os dois órfãos e com o marido inconsolável, que amamos durante sete anos como a um filho. Se é que isso é possível! A gravidade das outras condições aqui não lhe é desconhecida. Tenho muito que fazer, mas nada estanca o empobrecimento.
Tradução de Marcia Aguiar