Bebê com RG: Sujeito de direitos desde o nascimento 10/12/2015

Por Ana Carolina Barros Silva

Uma mudança não só para aquele sujeito ainda em constituição, mas também para a organização da dinâmica familiar e da sociedade

Desde o dia 02 de novembro de 2015, no estado do Rio de Janeiro, os hospitais maternidades podem emitir o Registro Geral (RG) de crianças recém-nascidas. A decisão de possibilitar a emissão de um documento pessoal logo ao nascer que, na origem, visa a facilitar os processos de localização de bebês desaparecidos ou sequestrados, passa por uma posição que legitima o lugar da criança, ainda que recém-nascida.

Boas novas! A criança poderá, a partir de uma tomada de decisão ético-política, portar um documento oficialmente reconhecido em todo território nacional, com sua foto, sua digital, seu nome e sobrenome. Ela pode ser cidadã no mundo.

Esta é uma decisão consistente com a implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente, reflexo do início de uma importante virada (em constante movimento de avanços e retrocessos) no campo jurídico, ético e político, qual seja: a passagem da criança controlada, tutelada, assujeitada ao discurso e desejo do Outro para a criança que pode ser sujeito de direitos, que pode buscar para si um lugar singular no mundo.

Este deslocamento no modo de olhar a criança é construído histórico, social e culturalmente e tem efeitos psíquicos e subjetivos importantes, não só para aquele sujeito ainda em constituição, mas também para a organização da dinâmica familiar e da sociedade. Para refletir a respeito desses efeitos, podemos pensar, por exemplo, na função do analista de crianças, que, em muitos casos, passa por poder propiciar um espaço analítico no qual a criança, que chega ao consultório colada aos discursos que a rodeiam, possa assumir e sustentar uma posição enunciativa.

Ter um RG, portanto, pode ser lido como uma conquista análoga a desfixar-se do lugar ditado pelo Outro. Estamos em um momento histórico feliz, no qual cada falante pode dizer sobre si mesmo desde seu lugar único, ou seja, pode tomar a autoria da própria história e assinar, no decorrer desse processo, sua narrativa, com seu nome próprio. 

Ana Carolina Barros Silva é psicóloga, psicanalista e mestre em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. 

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