Por Claudia Riolfi
Chega de tentar entender o que não tem cabimento: na presença do intolerável, basta dizer um sonoro não
Saiu na Tribuna de Minas. Um professor de geografia, de 30 anos, foi surpreendido quando um dos alunos do 9º ano apagou a luz no meio da chamada e outro, aproveitando-se do escurinho, caminhou até a mesa e lhe deu vários tapas na cara. O jovem homem registrou Boletim de Ocorrência e declarou sua vontade de abandonar a carreira em função da insegurança. Sério? Esse é mais um dos inúmeros casos de violência na escola que estão se tornando quase banais. Os educadores são apenas vítimas inocentes?
Na direção de ajudar a compreender como o professor pode estar, de algum modo, implicado na violência na escola, recorrerei ao desenho animado Jumanji, cujo título se origina do nome de um videogame que propõe aos jogadores um enigma (em forma de frase) que deve ser resolvido para que a partida seja encerrada. Após receberem o enigma, os jogadores são, a cada vez, transportados para dentro do jogo (para o país Jumanji) onde devem viver as aventuras das quais não têm conhecimento prévio.
O jogo é radical, pois quem não consegue arranjar uma significação para a frase recebida antes de iniciar a partida fica preso para sempre; isso se conseguir sobreviver aos perigos concretos que se sucedem. O enigma de Jumanji, portanto, coloca o sujeito em perigo mortal. Para sobreviver ao jogo, os protagonistas (dois irmãos, um menino de nove anos e uma menina com cerca de treze) precisam ser criativos do começo ao fim.
Na prática, entretanto, sempre surgia a mesma complicação: o garoto (que, supostamente, estava lutando com os inimigos para sair daquele lugar desagradável), lá pelas tantas identificava-se a ele e, sem se dar conta, passava a jogar do seu lado, sabotando a si mesmo. Podemos tomar esse processo como uma metáfora da tendência que todos temos quando a vida nos lança problemas que, de tão enigmáticos, parecem insolúveis.
De que maneira Jumanji pode ajudar a entender a parte que um professor pode ter nos problemas dos quais se queixa? Mostrando que, muitas vezes, identificado aos colegas que se mostram francamente insatisfeitos, eles se põem a jogar contra eles mesmos, pois, sem se darem conta, imaginam que, mantendo a insatisfação, manterão, também, por assim dizer, a dose de adrenalina que nos faz sentir vivos. Esquecem que a vida é um jogo radical e, consequentemente, não podem transmitir essa mensagem aos seus alunos. A consequência é prosseguirem em uma escalada amedrontadora em direção a um gozo sem limites.
Por que o aluno estapeou seu professor? Não interessa. Só sairemos de Jumanji se não nos identificarmos a ele. Caso tentemos, vamos gastar o tempo que deveria estar sendo utilizado para o ato pedagógico para olhar o aluno e suas gracinhas. Vale o velho conselho: “Não há espetáculo sem plateia”. Chega de tentar entender.
Claudia Riolfi é psicanalista, cursou pós-doutorado em Linguística na Université Paris 8 Vincennes-Saint-Denis. Professora na Faculdade de Educação na Universidade de São Paulo. Diretora Geral do IPLA