Por Ana Carolina Barros Silva
O século XXI trouxe alterações paradigmáticas importantes que refletem nos mais variados aspectos da sociedade contemporânea, a família e seus membros é um deles.
“Cresce a proporção de jovens ‘nem, nem, nem´” foi o curioso título da reportagem de Daniela Amorim e Idiana Tomazelli, publicada no jornal “O Estado de São Paulo” (13 de janeiro de 2015). O texto informa que, contrariando a tendência de queda iniciada na década de 90, a população formada por jovens que nem trabalham, nem estudam e nem procuram emprego aumentou nos últimos anos. Como ler esta estatística com psicanálise?
Ao falarmos a respeito de uma “mudança de tendência”, precisamos parar para pensar no que exatamente se modificou. O século XXI trouxe alterações paradigmáticas importantes que refletem nos mais variados aspectos da sociedade contemporânea, a família e seus membros é um deles.
Ao refletirmos acerca da passagem de uma sociedade patriarcal fortemente referenciada em um determinado padrão de comportamento para uma sociedade onde o patriarcado é questionado e os referentes, quando existem, são fluidos, podemos verificar que a família, na atualidade, encontra-se em um processo de redefinições de papéis, de funções e de direções. Por essa razão, é natural que existam pais que enfrentam grandes dificuldades para se reposicionarem em suas funções quando os filhos crescem e filhos que vivenciam impasses, medos ou inseguranças à medida que iniciam a vida adulta. Os dois lados da moeda podem propiciar um emaranhado complexo de se desfazer e gerador de muitos problemas para todos os envolvidos. Nesse contexto, muitos jovens e muitos pais relatam uma sensação de “confusão” em relação ao que “deveria ser feito”.
Parece-nos que a solução está na mudança de paradigma. Interrogar-se a respeito do que deveria ser feito supõe a crença na existência de um padrão ou de uma normativa. Fica, de fato, complicado encontrar um “modo de se comportar” padronizado em uma sociedade onde a singularidade é mais valorizada que os universalismos.
Sendo assim, é possível que o aumento de jovens “nem, nem, nem” esteja vinculado à dificuldade desses sujeitos em “encontrar-se a si mesmos no meio da confusão”, decidir sobre sua própria vida e sustentar suas escolhas no mundo.
Para sairmos de impasses como o exemplificado na reportagem, vale mais mudar as perguntas do que procurar respostas. É mais interessante nos perguntarmos qual a dinâmica que funciona para a família onde estamos inseridos do que levantar dedos acusadores. Assim, as novas e as velhas gerações podem respeitar a ética de seu desejo, agindo com responsabilidade e criatividade.
Ana Carolina Barros Silva é psicóloga, cursa especialização em psicanálise com crianças e mestrado na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.