Por Alain Mouzat

O medo parece um elemento   fortemente motivador quando se trata de implementação de políticas de saúde pública

Na França, como em outros países, o legislador continua sonhando com soluções para todos.  O projeto de lei visando a proibir os sites incitando a anorexia e a impor um índice de massa corpórea para os modelos nos desfiles de moda, já deu o que falar.

O senso comum aqui como em outros casos é péssimo conselheiro. No seu blog, uma ex- anoréxica apontou com muita clareza os vícios dessas medidas: a anoréxica, diz ela, não é animada por uma imagem ideal de magreza: a imagem é um efeito não uma causa. Se há um culto da magreza, acrescenta ela, não é invenção das anoréxicas, mas sim da sociedade no seu conjunto: que tal então proibir propagandas de livros e dietas prometendo emagrecer?

Medidas como estas, continua ela, denunciam que a anoréxica assusta, e revelam a incompreensão do legislador, deixando as anoréxicas ainda mais desamparadas.

O medo que ela aponta nas medidas anti-anoréxicas parece um elemento   fortemente motivador quando se trata de implementação de políticas de saúde pública: os ideais de boa saúde tratam qualquer forma de alteridade como ameaça, estigmatizando os desviantes e recorrendo a medidas de proibição ou de repressão.

Os exemplos não faltam: da mesma forma, muitos denunciaram o aumento, na França, do recurso à contenção em hospitais psiquiátricos, o que obrigou a ministra da saúde a tomar medidas regulamentando seu uso. Mais um exemplo:  lembremos que, no Brasil, houve quem sugerisse o uso de antidepressivo na água da cidade para dar conta dos humores depressivos dos cidadãos.

Essas políticas inspiradas nas melhores das boas intenções, zelar para a boa saúde de todos, sempre acabam se revelando o que são: implementações do discurso do mestre que sabe o que é bom para o outro.

Frente a isso nada melhor do que escutar a palavra de quem sofre, essa é a via do tratamento que visa exatamente a considerar o mais singular de cada um – a psicanálise.

Alain Mouzat é professor da Universidade de São Paulo, doutor em linguística, e psicanalista membro do Instituto da Psicanálise Lacaniana