Por Alain Mouzat
Hoje não é mais meu passado que me condena, mas a escolha do meu futuro que me pesa
De Freud a Lacan, do fim de uma sociedade vitoriana até o advento de nossa sociedade “pós-moderna”, constatamos o que mudou: a derrocado do pai e da sociedade vertical, a multiplicação das aberturas e das possibilidades, novos horizontes pipocando aqui e acolá…. Hoje não é mais meu passado que me condena, mas a escolha do meu futuro que me pesa. E com justa razão: as mudanças ficaram aceleradas, sem rumo coerente, e impossíveis de serem acompanhadas.
As mudanças avassaladoras irrompem nas nossas vidas, sem que tenhamos tempo de nos preparar – como fazia observar Hans Jonas, a dinâmica dos avanços da ciência e dos consequentes inventos tecnológicos, já há tempo escapou de qualquer política previsional.
A última a chegar é a do transhumanismo – isto é a questão das novas possibilidades de desenvolvimento do homem que a convergência entre nanotecnologia, biotecnologia, informática e ciências cognitivas possibilita – e ela é com certeza a mais premente.
Curar as doenças? Todos concordam. Consertar o defeito? Tudo bem, ainda terá que saber o que é defeito. Melhorar a espécie? Aí, não. É eugenismo.
Mas como assim?
Luc Ferry em seu último livro – A Revolução transhumanista – pondera: “ Trata-se pois, não de tudo proibir, mas de começar a pensar os limites, de refletir sobre as condições da regulação que deveria se impor a nível internacional”….
É de bom senso: encontrar a justa medida, o equilíbrio. Nada em excesso.
Já diziam os gregos, ”mêden agan”, e os latinos “Nequid nimis”. “Medida em todas as coisas”…
Mas até Jean de La Fontaine, o fabulista, avisava, ainda no século XVII – não contem com o homem: “ De todos os animais, o homem tem mais inclinação a entrar no excesso. Teria que censurar os pequenos e os grandes e não há vivalma que não peca. ‘Nada em excesso’ e um ponto do qual sempre se fala e que não se observa”.
E então?
A resposta, dizia Jorge Forbes já em 2002[i], não será da ordem da regulação e da lei: “A época da globalização que estamos entrando exige de cada um o exercício de seu próprio limite, que hoje em dia vem menos da “natureza” que da própria escolha responsável. É aquilo que eu quero que me restringe e não o que o outro, o tempo, por exemplo, me impede de conseguir”.
Alain Mouzat é professor da Universidade de São Paulo, doutor em linguística, psicanalista e membro do Instituto da Psicanálise Lacaniana.
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