Por Liége Lise
A mudança de paradigma que a adolescência inaugura é uma boa inspiração para a postura flexível e arriscada a que esse “admirável mundo novo” nos convida.
Com o advento da globalização e da pós-modernidade, visões de mundo se multiplicaram, ampliando, assim, o exercício humano de fazer escolhas no risco e sem as garantias antes dadas pelas referências da modernidade: pai, pátria e religião. O que esse novo tempo e a pluralidade de opções provocam? Será que a dita epidemia depressiva estende-se aos adolescentes?
A adolescência, tempo de frescor e vibração, de intensas sensações e sentimentos, é também marcada por lutos, dentre eles, a desconstrução dos ideais paternos e a perda do corpo infantil. A irreverência e a rebeldia refletem a desalienação aos ideais e o exercício das novas escolhas. A tristeza inerente a esse processo, por vezes, é confundida com depressão. Sem desconsiderar os casos reais, há uma tendência a patologizar a vida, transformando nossas dores em doença. Acredita-se que para tudo há um remédio. Assim, vale o lembrete: tristeza não é depressão!
A tendência hedonista gera acomodação e apatia, não só no adolescente como também em seus pais. Assim, o uso indiscriminado de antidepressivos é uma forma de evitar a reflexão, o enfrentamento e a criação de respostas aos impasses subjetivos. O desejo humano surge da falta e não há objeto que a sacie. A angústia é essencial ao ser humano; sendo o motor de criação e invenção diária que a vida nos pede.
A nossa sociedade se constrói em rede, numa estrutura horizontalizada e não mais vertical hierárquica. Hoje, há abertura para a acolhida das múltiplas expressões criativas. As receitas modernas não são as melhores respostas para os impasses que esse novo tempo traz. Para todas as idades, cabem as perguntas: que receita invento pra viver? De que forma vou amar você? Como as antigas categorias de interpretação não valem mais para ler os impasses subjetivos atuais, melhor apostar que questionar-se sobre a raiz do problema, pode levar a soluções originais. A mudança de paradigma que a adolescência inaugura é uma boa inspiração para a postura flexível e arriscada a que esse admirável mundo novo nos convida.
Liége Lise é psicanalista. Membro do IPLA – Instituto da Psicanálise Lacaniana- SP.