Por Claudia Riolfi e Laura Barzotto
Ao reservar ao jovem o lugar de quem está fora da vida, o ENEM colabora com sua apatia frente aos estudos
No dia 3 de novembro, 5,7 milhões de jovens saíram de suas casas para fazer o Exame Nacional do Ensino Médio 2012 – ENEM. Receberam uma publicação em cuja capa se lia “Um ensaio para a vida”. Desde quando vida tem ensaio? E, caso tivesse, por que começaria após a conclusão do ensino médio?
As articulistas, filha, 17 e mãe, 47, foram protagonistas, respectivamente, dos papéis de mãe-solícita-e-motorista e candidata-que-fez-68-pontos-e-deu-carona-aos-amigos. Decidiram examinar o texto das questões buscando responder em que mundo vivem os idealizadores da prova.
Para a primeira, em um mundo no qual os adultos pensam apenas na própria comodidade, e não em transmitir o legado cultural para as novas gerações. Para a segunda, em um mundo em que os macacos sentam em cima dos rabos. Reclamam da apatia dos jovens com relação aos conteúdos escolares e não se dão ao luxo de se interrogar a respeito de sua parte neste latifúndio.
Ambas interrogam: Por que os organizadores de um exame que visa a testar a capacidade de construir o raciocínio lógico dos candidatos não provaram ter construído, eles mesmos, o seu? Exemplos:
Os candidatos são convidados a preencher uma ficha com o seu endereço, mas, no momento de distribuí-los pelos locais de prova, são agrupados pela inicial do prenome. Qual é a lógica desta separação de candidatos? Eliminá-los por sua incapacidade para atravessar as metrópoles congestionadas? Testá-los em situação de cansaço e stress máximo? Ou, ainda, produzir inovadoras manchetes de jornal: Esse ano, os Ls foram melhores que os Ms. No geral, os Zs apresentaram um desempenho significativamente maior do que os outros? A vida para a qual ensaiam é a do primum vivere, na qual quem pode mais chora menos. Que império da burocracia! Aproximar iniciais valeu mais do que evitar o caos urbano.
Os alunos do ensino médio consideram uma prova boa quando, além de ser testado, ele aprende alguma coisa ao realizá-la. Neste sábado, quando esperavam que os cursinhos pré-vestibulares divulgassem os gabaritos do ENEM, divertiam-se com a seguinte publicação no Facebook: O que eu aprendi no ENEM 2012. Algumas respostas de inutilidades necessárias para fazer a prova: Que estilingue também pode ser chamado de atiradeira, O Garfield pode ter diabetes e que Existem garotas que acham que as lâmpadas de seus quartos servem como bronzeadores. Que psicologização da educação! A vontade de se identificar ao jovem valeu mais do que o senso de ridículo. Como não perceberam que ele sente sua inteligência insultada ao ter que ler isso?
Disseram que o ENEM é um ensaio para a vida. É pena que, tal “ensaio”, ao invés de ensinar os jovens que as palavras e as escolhas têm peso, pode estar lhes mostrando que qualquer coisa serve. Basta ser cômodo ou engraçadinho. Por que eles não estariam apáticos?