A sétima função da linguagem : a função performativa 03/03/2016

Por Alain Mouzat

Só há desejo daquilo que se pode dizer

Em um thriller linguístico sarrista, um jovem escritor decide reinterpretar a morte de Roland Barthes, em 1981. Não, Barthes, diz ele, não foi simplesmente atropelado pela caminhonete de entregas de uma lavanderia. Ele foi assassinado. E isso porque havia identificado e dominado o segredo de uma sétima função da linguagem, a função performativa.

O que é a performatividade? É a capacidade da língua de intervir no mundo, é a potência da palavra que, por ser proferida, torna-se ação. Motivo para o nosso autor imaginar crimes de políticos interessados em se apoderar do segredo de uma fala tão poderosa.

Resta, porém, avisar o autor, ou as personagens, que a performatividade da linguagem não age nos outros, mas em quem a enuncia. O próprio Barthes dava como exemplo de enunciado performativo, a frase eu te amo. “De certa maneira – paradoxo exorbitante da linguagem –, dizer eu te amo é fazer como se não houvesse nenhum teatro da palavra, e essa palavra é sempre verdadeira (ela não tem outro referente além de seu próprio proferir: é um performativo).

Barthes havia sem dúvida entendido o que Lacan dizia na fórmula “o desejo é sua interpretação”: só há desejo daquilo que se pode dizer, mas na exata medida em que essa proferição suspende “o teatro da palavra”, na medida em que, segundo os termos de Lacan, o desejo é tomado ao pé da letra.

À função performativa da linguagem, Lacan tinha dado um nome: um significante novo.

Alain Mouzat é professor da Universidade de São Paulo, doutor em linguística, psicanalista e membro do Instituto da Psicanálise Lacaniana.

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