A inovação e o desejo nas empresas 23/07/2014

Por Marina Soubhia

Inclusão de riscos e incertezas, amizade, estilo de liderança horizontal e criação responsável, são qualidades das empresas inovadoras, que vêm ao encontro da lógica da psicanálise

O blá blá blá organizacional nunca foi tão tedioso. As queixas se repetem num ciclo vicioso e pouco original: a eterna insatisfação com seus funcionários, a dificuldade de achar bons talentos, o alto custo para engajar seu pessoal. É a histeria em uma de suas melhores performances no mundo do trabalho. Apesar de Einstein já ter dito que fazer a mesma coisa e esperar resultados diferentes são expressões máximas da ineficiência, as empresas insistem no mesmo e recriam seus famigerados programas: atração de talentos, retenção a partir de benefícios, festinhas de fim de ano, home office etc. São muitos os investimentos que, contudo, não trazem os resultados esperados. O que torna essa situação ainda mais hilária é que a contragosto de todas as tentativas frustradas das empresas, por muitas vezes, seu pessoal troca todos os “maravilhosos benefícios” para se aventurar em um novo desafio, em uma empresa em fase de startup que ninguém nunca ouviu falar.

Mas por que isso acontece? Afinal de contas, como as empresas podem estar tão enganadas na sua forma de reter seus potenciais? Por que um talento deixa a estabilidade de seu emprego atual para trabalhar nos fundos de uma casa antiga num bairro mais afastado, dividindo o espaço com mais outras três empresas?

Penso que o “pulo do gato” está na estrutura proposta por essas jovens empresas. Enquanto as “anciãs”, que não se inovam, têm uma hierarquia vertical, engessada em protocolos, nos quais para se marcar uma reunião com o presidente é necessário enviar dez e-mails, falar com cinco assistentes e se programar com duas semanas de antecedência; as empresas mais “antenadas” já perceberam que, ao aumentar a autonomia, a conectividade, a responsabilidade, o impacto e a proximidade com a liderança, as chances de implicação com os projetos e a empresa aumentam significativamente. E o melhor de tudo: para falar com o presidente, só é preciso olhar para o lado.

Dessa forma, a empresa consegue promover o envolvimento das pessoas, permitindo que a singularidade dos funcionários ganhe expressão e evitando os jargões formais organizacionais. Essa proximidade promove um clima propício para a expressão da criatividade e a formação de laços de amizade. E quem não quer trabalhar com amigos? Outro tabu. Como lidar com os relacionamentos nas empresas? Mais um ponto para as empresas “antenadas”. Elas não somente permitem como promovem e incentivam que seus funcionários indiquem seus grandes amigos para trabalharem juntos.

É fácil identificar quais empresas valorizam ou reprimem essa iniciativa: basta observar as perguntas dos formulários de aplicação para vagas. A maioria pergunta: “Você conhece alguém que trabalha aqui na empresa?”, “Qual o seu relacionamento com essa pessoa?”. Já outras criam programas de recrutamento genuínos baseados nos ciclos de amizade de seus funcionários. O mais recente que vi dizia: “Já pensou que incrível seria trabalhar com seu amigo?”.

Inclusão de riscos e incertezas, amizade, simpatia, diversidade, estilo de liderança horizontal e criação responsável são qualidades que vêm ao encontro da lógica da psicanálise. Jorge Forbes afirmou em entrevista recente que: “A psicanálise é uma teoria mais forte para entender a época atual. Nós temos uma prática bastante consistente e estabelecida conceitualmente para não nos apavorarmos diante do mundo incompleto. Inconsciente, aliás, quer dizer aquilo que eu não sei. O mundo de hoje funciona através de mecanismos incompletos”.

A capacidade das empresas de leitura e posicionamento na pós-modernidade é a chave para a invenção de uma cultura empresarial que, além do convite à constante inovação, condição para existir nesse admirável mundo novo, toque o coração e a vida das suas pessoas.

Marina Soubhia é psicanalista e diretora de Recursos Humanos em uma multinacional no ramo de internet.