Por Liége Lise
Conselho Federal de Medicina proíbe práticas antienvelhecimento, que propõem terapias duvidosas para reverter os efeitos da idade, e reduzem o corpo a um maquinário que pode ser controlado quimicamente
Dorian Gray, o personagem de Oscar Wilde que atravessava as décadas jovem e belo, enquanto seu retrato refletia o passar do tempo, expressava, no século XIX, um desejo comum a muitos na atualidade: não envelhecer. Fausto, o protagonista da tragédia celebrizada por Goethe, foi ainda mais longe: assinou um contrato com o diabo e barganhou 24 anos de vida, sem envelhecer, em troca da própria alma. Saindo do plano da ficção, dada a quantidade de tratamentos, medicamentos e cosméticos para combater os efeitos da idade, será que, tal como os personagens, estamos imbuídos pela ideia de que o processo natural de envelhecimento pode ser reparado, e nos iludindo com soluções mágicas de rejuvenescimento a qualquer preço?
Já existe até uma especialidade médica dedicada a combater esse processo, como se fosse uma doença: a medicina antienvelhecimento, ou antiaging. Porém, por falta de comprovação científica e estudos que embasem com segurança os tratamentos antienvelhecimento, o Conselho Federal de Medicina (CFM), desde outubro, proibiu oficialmente essa prática terapêutica, pois a medicina antienvelhecimento ministra indiscriminadamente suplementação vitamínica e hormônios bioidênticos que, sem a criteriosa avaliação e cuidado na prescrição, trazem efeitos colaterais e lesivos a saúde. “Encontram-se evidências claras de riscos e prejuízos à saúde e nenhuma ou pouca evidência de benefícios para a capacidade funcional, qualidade de vida, cognição e para prevenir doenças crônicas associadas à idade”, diz o relatório do CFM.
A longevidade é uma tendência atual. O avanço da medicina e a melhoria das condições de vida contribuem para essa realidade. Porém, é inevitável que os efeitos dos anos se façam sentir no corpo e no espírito. Efeitos que, dependendo da sua interpretação, podem transformar o viver em uma aventura ou em uma corrida alucinada em busca de um padrão de saúde escravo de ideais limitantes e pouco criativos, num entendimento que envelhecer é um ônus biológico a ser compensado, e que o corpo se reduz a um maquinário ajustada e controlada quimicamente.
Para o psicanalista Jorge Forbes: “se continuarmos impotentes, enxergando a velhice como o fim dos projetos, o vazio do presente e a saudade do passado, seremos cúmplices da epidemia de depressão que se instala. O envelhecimento não é doença, não é castigo, não é um problema a ser combatido com terapias duvidosas; é um processo inerente ao desenvolvimento humano, que pode e deve ser vivido de forma saudável. Um novo velho está nascendo, não tanto o da experiência, como se dizia, mas o da criatividade: passado o tempo do embate pela vida, chega o momento de viajar na bagagem selecionada e de visualizar novos campos de pouso, longe dos asilos do mundo anterior.”