Por Claudia Riolfi
Não tenhamos medo de prejudicar a beleza da infância de nossos filhos poupando-os do óbvio. Quando alguém não encontra anteparos para se proteger de uma experiência insuportável, pode acabar se oferecendo a ela. Santa Maria!
Nada na vida é tão caro quanto a doença ou a estupidez, Freud ensinou. Por que ainda não aprendemos a lição? Hoje, quando a longevidade bate recorde, crescem as “mortes estúpidas”. O que as configura? O fato de alguém se deixar levar para fora da vida sem ter decidido suicidar-se. São tragédias sem sentido nas quais o protagonista sai do palco em um acidente que poderia ser evitado caso o morto tivesse mantido uma relação mais atenta com suas circunstâncias.
Exemplos: o ocorrido com as vítimas do maníaco do parque, o sedutor que convencia as mocinhas feias a seguirem-no para parques desertos nos quais, supostamente, após terem sido fotografadas, fariam sucesso como modelo. Os afogamentos daqueles que se espremeram em barcos com lotação três, quatro vezes maior do que o legalmente permitido.
São mortes que não precisavam ter acontecido. Ocorreram quando alguém cegou para a inevitabilidade da morte e, por sua desatenção, se precipitou catastroficamente para esta experiência. É fácil para todo mundo ficar com ódio dos criminosos, mas é bem mais complicado responder algumas questões embaraçosas. Por que as moças acreditaram que o estuprador as tornaria ricas e famosas? E por que quem entra em um barco sem saber nadar não procura o salva-vidas? Onde estavam com a cabeça? Onde estava quem deveria ter educado estas pessoas para se manterem vivas?
Nossos antepassados foram mais sábios: quando a expectativa de vida era bem menor, não poupavam as crianças do necessário conhecimento a respeito de sua finitude e fragilidade. Tornavam a morte presente na vida. Na Escócia, por exemplo, elas eram levadas para colocar as mãos nos defuntos, para que seus fantasmas não as assombrassem durante a noite. Na França, era comum que acompanhassem seus pais para assistir às decapitações em praça pública.
Não tenhamos medo de prejudicar a beleza da infância de nossos filhos poupando-os do óbvio. Quando alguém não encontra anteparos para se proteger de uma experiência insuportável (como é o caso da certeza de ser mortal em uma sociedade que nega esta obviedade), pode acabar se oferecendo a ela. Santa Maria!