A ciência charlatã? 08/08/2013

Por Alain Mouzat

Rapidamente, pesquisas sérias se tornam, na imprensa, uma cura milagrosa. Vacina contra a Aids, cura do câncer… culpa da imprensa? Ou seria o nosso desejo de ilusão?

Sem surpresa! Uma revista semanal anunciou o novo remédio universal, a melatonina. Sem medo dos problemas que isso possa acarretar, o artigo enumerou suas vantagens: serve para insônia, enxaqueca, diabete, coração, Alzheimer etc… etc… etc… Além disso, emagrece! O que não deixa de surpreender é como a imprensa insiste em publicar artigos desse teor. Contudo, essa insistência só existe porque há uma demanda gerada pelo público: panaceia e pedra filosofal sempre venderam.

Hoje é fácil desmontar a pseudo-cientificidade dos argumentos. Basta uma pesquisa na internet para retificar (ou não) as informações: as “investigações científicas” parecem se anular umas às outras. Todos concordam que a melatonina é um hormônio regulador do ciclo cronobiológico e pode ter efeito benéfico sobre o sono, dependendo das doses. Mas concordâncias param aí. Tem até pesquisa afirmando que o consumo de nozes já bastaria para elevar o nível desse hormônio em taxas, dispensando qualquer remédio.

A verdade é que a pesquisa é encomendada pela associação dos produtores de nozes da Califórnia… Aí entramos na espiral das suspeitas e desconfianças. Como escapar?

Se não quisermos entrar no rol das vítimas da credulidade pública, do golpe do bilhete premiado, do golpe do vigário, deveremos desacreditar da ciência e das notícias que dela nos chegam?

Pesquisas sérias se tornam logo, na imprensa, uma cura milagrosa. Vacina contra a Aids, cura do câncer… culpa da imprensa? Ou seria o nosso desejo de ilusão? O que não arrefece é a nossa capacidade de querer tampar o buraco, costurar o rasgo da desarmonia de nossa condição.

A ciência pesquisa, inventa soluções para problemas que identifica. A imprensa publica notícias e dá aos leitores o que eles vêm buscar. Parece muito tênue o que faz a diferença entre um avanço científico e o anúncio do charlatão. Isso depende da nossa capacidade em esperar menos. Tem remédio para isso?

Alain Mouzat é professor da Universidade de São Paulo, doutor em linguística, e psicanalista membro do Instituto da Psicanálise Lacaniana